Aquele que pertence
organicamente a uma sociedade, não pode identificar a natureza do mal que a mina.
O seu diagnóstico pouco ou nada conta; o juízo que fizer sobre ela,
implicá-lo-á; poupá-la-á por egoísmo.
Mais
desprendido,mais livre, o cidadão comum examina sem cálculo e apreende melhor
as falhas. Se a sociedade se perder, aceitará, se necessário, perder-se também,
atestar nela e em si próprio os efeitos do fatum.
Remédios, não os
possui nem os propõe. Como sabe que não se cura o destino, não se arvora em
curandeiro junto de ninguém. A sua única ambição: estar à altura do
Incurável...!
Perante a
acumulação dos seus sucessos, os países do Ocidente não tiveram dificuldade
emexaltar a História, em atribuir-lhe um significado e uma finalidade. Ela
pertencia-lhes, eram eles os seus agentes: a História devia, por isso, seguir
uma via racional…
Colocaram-na,
assim, sucessivamente, sob os auspícios da Providência, da Razão e do
Progresso. Faltava-lhes o sentido da fatalidade; começam enfim a adquiri-lo,
aterrados pela ausência que os espreita, pela perspectiva do seu eclipse. De
sujeitos, eis que se tornam objectos, para sempre despojados dessa irradiação,
dessa admirável megalomania que até hoje os protegera contra o irreparável.
Hoje estão tão conscientes
disso que medem a estupidez de um espírito pelo grau do seu apego aos
acontecimentos. Nada mais normal, uma vez que os acontecimentos se passam
noutro lado.
Só se sacrifica aos
acontecimentos quando deles se conserva a iniciativa. Mas por pouco que se
guarde a lembrança de uma antiga supremacia, continua ainda a sonhar-se ser grande,
que mais não seja na desgraça.
A França, a
Inglaterra, a Alemanha deixaram para trás o seu período de expansão e de
loucura. É o fim da insensatez, o início das guerras defensivas, enquanto,por
exemplo em Portugal se sonha e divaga sobre a competitividade com esses países,
provocando, graças a uma megalomania renovada, a mortificação do povo.
Já não há aventura
colectiva, já não há cidadãos, mas sim indivíduos pálidos e desenganados,
prontos ainda a responder a uma utopia, porém sob a condição de esta chegar do
exterior e de não terem que proceder ao esforço de a conceber.
Se outrora morriam
pelo sem-sentido da glória, abandonam-se agora a um frenesim reivindicativo.
A “felicidade”
tenta-os; é o seu último preconceito, a que esse pecado de optimismo de uma
suposta social-democracia vai buscar a sua energia, e pretende submeter todo o
povo a uma ideologia que não é a sua.
Preferir não ver,
servir, entregar-se ao ridículo ou à estupidez de uma causa – extravagâncias de
que já não são capazes.
Quando uma nação
começa a envelhecer, tende para a condição de massa. Ainda que dispusesse de
mil Napoleões ou de mil Salazares, não deixaria de se recusar a comprometer o
seu repouso ou o dos outros.
Com reflexos
vacilantes, quem aterrorizar e como? Se todos os povos se encontrassem no mesmo
estádio de fossilização ou de cobardia, entender-se-iam facilmente: à
insegurança sucederia a permanência de um pacto de cobardes…
Ora, o povo
português foi oprimido, é-o ainda, mas nunca foi cobarde! E, apesar do que
dizem, também nunca foi o melhor povo do mundo, e, penso, estar em condições de
o demonstrar cabalmente, face a esses políticos dominantes que usam de má fé
para com ele.
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