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quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

«O FUTURO PERTENCE AOS SUBÚRBIOS DO GLOBO»


Tantas conquistas, aquisições, ideias, onde se irão perpetuar? Na Rússia? Na América do Norte? Uma e outra já tiraram as suas conclusões do pior da Europa… A América Latina? A África do Sul? A Austrália?

É nessas paragens que, ao que parece, devemos esperar ser rendidos. Sucessão caricatural.

Se na ordem do espírito, quisermos pesar os sucessos obtidos do Renascimento até aos nossos dias, não nos demoraremos nos da filosofia,um vez que a filosofia ocidental em nada é superior à grega, à hindu ou à chinesa.

Quando muito, é-lhes comparável sob certos aspectos.

Como não representa senão uma variedade do esforço filosófico em  geral, poderíamos em rigor dispensá-la e opor-lhe as meditações de Çankara, de um Lao-Tse, de um Platão.

O mesmo não acontece com a música, essa grande desculpa do mundo moderno, fenómeno sem paralelo em qualquer tradição.

Onde encontraríamos o equivalente de um Monteverdi, de um Bach, de um Mozart?

É através dela que o Ocidente revela a sua fisionomia e atinge a profundidade.

Se não criou nem uma sabedoria, nem uma metafísica que lhe sejam verdadeiramente próprias, nem mesmo uma poesia da qual possamos dizer que é sem precedente, deixou, em compensação, nas suas projecções musicais, toda a sua força de originalidade, toda a sua subtileza, todo o seu mistério e toda a sua capacidade de inefável.

Pôde amar a razão até à perversidade; o seu verdadeiro génio foi, todavia, um génio afectivo. O mal que mais honra? A hipertrofia da alma.

Sem a música, não teria produzido senão um estilo de civilização banal, previsível…

No seu balanço final, só a música dará testemunho de que não se arruinou em vão, de que havia realmente algo a perder.

Acontece por vezes ao homem escapar às perseguições do desejo, à tirania do instinto de conservação. Lisonjeado com a perspectiva de falhar,  sapa a própria vontade, esmera-se na apatia, ergue-se contra si próprio e invoca o seu génio do mal.

Afadigado, presa de mil actividades que o prejudicam, descobre um dinamismo cujos atractivos não suspeitaria: o dinamismo da desagregação. Sente-se muito orgulhoso do facto: poderá enfim  renovar-se à sua custa.

No mais íntimo dos indivíduos como das colectividades, habita uma energia destruidora que lhes permite ruir com certo brio: exaltação ácida, euforia do aniquilamento!

Entregando-se-lhes, esperam sem dúvida curar-se dessa doença que é a consciência. E, de facto, todo o estado consciente nos extenua, nos esgota, conspira para o nosso desgaste; quanto maior é o seu império sobre nós, mais gostaríamos de nos reintegrar na noite que precedia as nossas vigílias,  de mergulhar no repouso anterior às maquinações, ao atentado do “Eu”.

Aspiração de espíritos turtuosos e que explica como, em certas épocas, o indivíduo, exasperado por estar sempre a tropeçar em si próprio, sempre a ruminar a sua diferença, se volta para esses tempos em que, formando um só ser com o mundo, não abandonara ainda a companhia dos seres nem degenerara em homem.

Avidez e horror da consciência,  a História traduz ao mesmo tempo o desejo que um animal enfermo tem de realizar a sua vocação e o medo que sente de o conseguir. Medo justificado: que desgraça o espera no termo da sua aventura!

Não viveremos um desses momentos em que, num dado espaço, teremos que assistir à sua última metamorfose?




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