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sexta-feira, 19 de abril de 2013

«O TRIUNFO DA MORTE: A PESTE TRAZ O HORROR À EUROPA»

Em 1348 a peste negra varreu sem descanso a Europa,  provocando talvez 25 milhões de mortos. Dois anos depois, o martírio parecia ter acabado, mas surtos de peste iriam tornar-se num pesadelo recorrente.

O historiador francês contemporâneo Fean de Venette escreveu: “Em 1348, para além da fome e da guerra, a pesta apareceu no mundo”. Efectivamente, tinham-se espalhado rumores nos portos europeus durante mais de 10 anos de que alguma coisa terrível tinha acontecido em terras distantes, de que a Índia estava despovoada, de que a Síria e a Arménia estavam cobertas de cadáveres.

Foi nessa altura que três galeotas chegaram a Génova, com seus marinheiros infectados por picadas de pulgas contaminadas pelas ratazanas do navio. Embora os marinheiros tenham sido obrigados a regressar ao mar “porque ninguém ousava tocar-lhes”, já era tarde. A peste tinha chegado, a mais violenta epidemia de peste bubónica e pneumónica alguma vez registada. Nos dois anos seguintes, mataria entre um terço e a metade da população da Europa, porventura quase 25 milhões de pessoas.

A morte vinha depressa. O escrito Bocaccio testemunhou a peste em Florença: “Mostrava-se primeiramente pela emergência de certos tumores nas virilhas ou nas axilas, alguns dos quais cresciam ou ficavam do tamanho de uma maçã, outros de um ovo.” Ele acreditava que depois dos tumores, ou “bubões”, aparecerem, a pessoa infectada morreria no espaço de um dia, embora outros notassem que as vítimas habitualmente padeciam da doença durnaate 4 ou 5 dias.

O termo “peste bubónica” deriva destes rumores; a expressão “peste negra”, da cor que eles adquiriam. A doença saltou rapidamente de um país para o outro: no final de 1348 havia ocorrências em França, Espanha e Inglaterra.

O mais perturbador era o facto de as pessoas, nesse tempo, não perceberem como é que a infecção se espalhava. O médico do papa de Avinhão, Guy de Chauliac, um homem notável com maior conhecimento da epidemia do que qualquer contemporãneo, declarava que se podia apanhar a doença “simplesmente olhando para pessoas doentes.” Um médico em Paris escreveu que “uma única pessoa doente pode infectar o mundo inteiro.”

Dois tipos de peste constituíram a peste negra. Na altura só Chauliac reparou que, além dos bubões, havia outro conjunto de sintomas bastante distinto: febre contínua e expectoração de sangue.

Apesar de ele disso se ter apercebido, tinha acabado de identificar a muito mais infecciosa peste penumónica, da qual, como ele referiu, uma vítima morria em dois dias. O tipo bubónico era disseminado pelas pulgas da ratazana; o pneumónico, por uma pessoa tossindo.

Numa epidemia na Manchúria, tão recentemente quanto 1921, a esperança de vida daqueles que apanhavam a peste pneumónica era inferior a dois dias.

Depois de dois anos sombrios em que parecia que não havia esperança, 1348 e 1349, o pesadelo desvaneceu-se tão subitamente quanto chegara. Em 1350, o papa Clemente V anunciou um ano de jubileu e um milhão de peregrinos dirigiu-se a Roma para celebrar a sobrevivência da humanidade. Estavam todos terrivelmente enganados. Dez anos depois, a pestilência regressou, e depois novamente em 1369. Mesmo 1348 não foi o início, pois a peste já tinha aparecido antes. Escrevendo no século VIII, o historiador inglês Beda registava que no século V, cerca de 450, “os vivos tinham dificuldades em enterrar os mortos.

Um dos grandes mistérios do passado britânico reside no facto de menos de dez mil emigrantes alnglo-saxões terem conquistado um país com uma população entre 5 e 10 milhões de almas. A peste pode oferecer uma explicação.

Pouco tempo depois de a epidemia acontecer, os Anglos, cujo avanço tinha sido sustido durante meio século – devido à actuação do rei Artur, acreditar na lenda – reiniciaram o processo que terminaria com a conquista da ilha. Pensa-se que os invasores não tivessem sido afectados pela peste, pois, ao contrário dos Britânicos, não comercializavam com a Europa mediterrânica. Garrafas vazias encontradas enterradas em fortificações mostram que o comércio do vinho era florescente e é possível que com ele tivesse vindo a peste.

Ninguém escreveu um testemunho presencial nessa altura, mas, quando a doença voltou, já isso não sucedeu.

Em 543, no reinado do imperador Justiniano, a peste varreu o Império Romano do Oriente e um ano depois, durante a sua infância, o historiador franco Gregório de Tours viu-a a passa na Gália. Em 550, na Irlanda, os anais registam que a “peste amarela” tinha sobrevivido.

Pode vislumbrar-se o terror que as pessoas devem ter sentido na narrativa da morte do rei galês Maelgwn, o Alto, que tinha deixado a sua fortaleza no topo da montanha próxima da actual cidade de Llandudno para se refugiar na igreja em Rhôs, que ainda existe presentemente. Diz-se que o rei espreitou pelo buraco da fechadura e viu a “peste amarela a galopar na sua direcção.”

Em 1382, uma geração depois da peste negra, a doença voltou, aparentemente vinda de nenhum lado, tal como aconteceria repetidamente até ao século XVI, com espaços de 4 a 12 anos entre cada ocorrência.

O mito acerca da peste negra consiste em pensar que ela era e é uma das doenças mais contagiosas alguma vez conhecida. Mas a peste negra pode ser hoje completamente curada pela tetraciclina, a mais simples e mais barata forma de antibiótico,  descoberta nos anos 40 do século passado.

OS SERVOS CONTRA-ATACAM

Na altura, a peste negra parecia o acontecimento mais terrível na história do mundo. Porém, para um dos grupos sociais providenciou uma oportunidade para que ele compreendesse o seu poder. Nesta nova época em que a força do trabalho era escassa, aqueles que recebiam salários começaram a pedir aumentos.

Em 1349, no meio da epidemia, os tanoeiros de Amiens pediram um aumento do seu salário.

Alguns servos insistiam em pagar as suas rendas e, por conseguinte, libertarem-se das obrigações para com os senhores, enquanto outros se limitaram a abandonar as terras onde trabalhavam.

O estatuto dos trabalhadores de 1351 tentou forçar os salários a regressarem aos seus níveis anteriores à peste.

Foram introduzidos impostos que provocaram motins e na revolta dos camponeses de 1381 os trabalhadores reclamaram o fim da servidão.

Embora essas rebeliões tenham sido implacavelmente reprimidas, os ventos da mudança eram já imparáveis.


E hoje, vive-se na Europa do Sul, sobretudo, uma verdadeira peste em que os governantes pretendem também reprimir custe o que custar os trabalhadores em geral, impondo-lhes cada vez mais impostos e desrespeitando as constituições, sobretudo a portuguesa, considerando que a população não deve, não pode ter direitos, devendo ser tratada dentro da mais profunda servidão. E quem diz que hoje não está aí a peste? Ela está bem aí, só que disfarçada de “governante”, sendo o grande martírio da cidadania nacional.

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