O bispo D. Carlos
Azevedo terá assediado sexualmente o sacerdote José Nuno em três ocasiões: nos
anos 80, nos anos 90 e a última em 2009. Vários padres, ex-padres e amigos
quebram o silêncio na VISÃO desta semana e relatam como acompanharam o
sofrimento vivido pelo capelão do Hospital de São João, no Porto
Os testemunhos ouvidos pela
VISÃO desta semana permitem igualmente perceber as razões que levaram o
sacerdote a denunciar o antigo bispo auxiliar de Lisboa ao representante da
Santa Sé. Decisão e gesto doloroso que, dizem, levaram o coordenador nacional
das capelanias hospitalares a uma profunda depressão. Tudo em nome da verdade
na Igreja, dizem.
Nesta mesma edição,
publicamos ainda um perfil sobre o padre José Nuno Ferreira da Silva, de 48
anos, com episódios, relatos e depoimentos de figuras públicas sobre o seu
percurso de vida e profissional.
Azeredo Lopes, da
Universidade Católica, conhece o sacerdote há mais de 20 anos e admira a sua “inteligência
e sensibilidade”.
- Conheça aqui algumas dessas figuras, recorde
a cronologia deste caso (em baixo) e saiba tudo na VISÃO desta semana, a
partir de quinta-feira nas bancas
Cronologia de um caso
Na véspera de publicação da história pela VISÃO, ao final do dia, já o
tema da capa da revista era notícia. De Roma à SIC, D. Carlos Azevedo negou
"totalmente" as acusações. "Remexer em assuntos de há 30 anos,
que não ofenderam a moral pública, não serve de modo ético a informação, mas
visa meramente o sensacionalismo para destruir pessoas", afirmou o bispo,
realçando que o caso estaria apenas relacionado com "atos da vida privada
que não atentam contra a dignidade dos outros (...). Quando conheci a pessoa em
causa, ela era já adulta e grande", justificou. Referindo não excluir do
seu "amor e dedicação" pessoas que experimentaram "limites
dramáticos da condição humana", D. Carlos reconheceu que a atitude
"tem trazido olhares de suspeita e atitudes de ambiguidade que me fazem
objeto de má-língua".
Nessa mesma noite, mas com data do dia seguinte, a Conferência Episcopal, num comunicado
assinado pelo seu porta-voz, Manuel Morujão, tornava pública a sua posição, sem
desmentir a VISÃO: "Contrariando as nossas expectativas", lê-se no
documento, "vemos que o nome do bispo D. Carlos Azevedo, atualmente em
Roma, está envolvido em acusações de comportamentos impróprios, não conformes
com a dignidade e a responsabilidade do estado sacerdotal. Da sua veracidade
não podemos nem devemos julgar apressadamente. De qualquer membro da Igreja se
espera um comportamento exemplar. Com muito maior razão de quem se comprometeu
a viver o celibato sacerdotal", adverte-se, no texto, concluindo: "D.
Carlos Azevedo pode contar com a nossa solicitude e a nossa oração
fraterna."
Aos microfones da Rádio Renascença, D. Nuno Brás, bispo auxiliar de Lisboa, admitiu
que "a Igreja é constituída por pecadores, uns mais do que outros",
atribuindo as notícias a "tentativas de influenciar o conclave".
Na TSF, D. Januário Torgal Ferreira disse não se ter espantado com as suspeitas
de assédio sexual: "É indiscutível que, em determinadas zonas da nossa
sociedade, havia comentários dessa ordem", assinalou, concluindo que
"o comportamento homossexual" do bispo já era objeto de comentários
"desde 2006, 2007".
Anunciada no dia anterior, em declarações à SIC, a conferência de imprensa de
D. Carlos Azevedo no Vaticano, é anulada, bem como a sua presença num seminário
com jornalistas portugueses. O bispo está em "recolhimento", garante
Rosário Salgueiro, a enviada da RTP a Roma, que atribui a reportagem da VISÃO a
uma "guerra da maçonaria católica e da Opus Dei", porque, "de um
lado e do outro não querem que D. Carlos Azevedo assuma o lugar de
cardeal-patriarca".
À SIC, o padre Carreira das Neves confirma já ter "ouvido coisas, rumores.
Já sabia que havia, em relação ao D. Carlos, alguns problemas complicados (...)
e que talvez tenha ido para Roma por causa desses problemas complicados (...).
A homossexualidade é reconhecida (...) tem pessoas a quem o dizia",
assinalou.
A Rede de Cuidadores, pela voz do psiquiatra Álvaro de Carvalho, confirma ter
"conhecimento de notícias deste teor em relação ao senhor bispo
(...)", mas por não se tratar de caso de abuso de menores não foi
denunciado às autoridades. "Tivemos uma referência informal, há cerca de
ano e meio, dois anos, de que teria sido por uma situação de assédio sexual do
senhor D. Carlos Azevedo que ele teria sido transferido para Roma", além
de outras situações "variadas no tempo e geograficamente (...)". E o
psiquiatra criticou a Igreja por "mais uma vez, enfiar a cabeça na areia
como a avestruz".
Em Itália, o Vatican Insider, publicado pelo diário La Stampa, dá eco à
reportagem sobre D. Carlos, mas com erros: contrariando o que a VISÃO escreveu,
noticia que o bispo foi denunciado por "abuso sexual" por factos
ocorridos nos anos oitenta.
O diário La Repubblica atribui a resignação do Papa Bento XVI à existência de
um relatório de 300 páginas, elaborado por três cardeais, no qual se refere a
existência de uma "rede transversal unida pela orientação sexual"
ligada a desvios de dinheiro, corrupção e lutas pelo poder na Cúria.
O porta-voz do Vaticano nega a existência de qualquer investigação sobre
o bispo. "É uma pessoa que estimamos muito, que cumpre muito bem as suas
funções no Conselho Pontifício da Cultura. Não me parece que haja um processo
em curso contra ele e, portanto, consideramo-lo com pleno respeito e plena
dignidade (...) Neste período, há muitos ataques e intervenções que pretendem
criar confusões e turbulências na Igreja", diz Frederico Lombardi, que confirmara ter lido o artigo da VISÃO
na véspera da saída da revista para as bancas.
D. Carlos reaparece e volta a falar à SIC: "Estas notícias devem ser
enquadradas no ambiente de preparação do Conclave e de sucessão do patriarca de
Lisboa", justifica.
O Correio da Manhã noticia que um grupo de padres, que
prefere manter-se anónimo, vai enviar uma carta ao Núncio Apostólico exigindo
um "rápido e cabal" esclarecimento sobre as notícias vindas a
público. O mesmo jornal faz referência às declarações de D. Jorge Ortiga, bispo
de Braga, que presta solidariedade ao sacerdote José Nuno e a D. Carlos, pois
"ambos estão a sofrer muito". Ao JN, o bispo D. Carlos revela estar a
receber "muitas provas de solidariedade e de oração" e "muitas
manifestações de estima". D. Manuel Clemente, bispo do Porto, admite à
RTP, pela primeira vez, a veracidade da história, mas criticando,
indiretamente, a VISÃO: "O caso foi tratado por quem o quis tratar daquela
maneira no âmbito eclesial e com alguma reserva. Eu pergunto-me se não há aqui
uma ofensa aos direitos humanos trazer para público algo que as próprias
pessoas e a própria pessoa quis tratar de uma maneira pessoal e
reservada."
À tarde, o padre José Nuno reaparece em público, ao lado do bispo do Porto, nas
Jornadas Vicariais da Fé, em Gondomar.
O JN faz referência a uma missa do padre José Nuno, na capela do
Hospital de São João, celebrada no domingo. "Disse o que tinha a dizer, no
momento necessário, às instâncias certas dentro da Igreja", repete o
sacerdote ao jornal, num cenário nunca visto: "Diz quem frequenta a capela
hospitalar que não há memória de uma missa tão participada", escreve o
diário.
Em Milheirós de Poiares, terra de D. Carlos Azevedo, o povo continua indignado
com a denúncia contra o bispo. Na homília da missa de domingo, o pároco local,
segundo o Correio da Manhã, diz que "a resignação do Papa é mais
importante do que uma notícia que correu na semana passada".
O DN noticia que D. José Policarpo pode deixar, nos próximos
dias, o lugar de Cardeal-Patriarca
=Visão=