Uma civilização apenas existe e se afirma por
meio de actos de provocação. Começa a ser cordata? Desmorona-se. Os seus
momentos culminantes são momentos temíveis, durante os quais, longe de
armazenar forças, prodigaliza-as.
Ávido de se extenuar, Portugal assumiu a
tarefa de desperdiçar as suas; e conseguiu, auxiliado pelo seu orgulho, mas ao
mesmo tempo subserviência aos países do norte, pelo seu zelo agressivo dos seus
governantes em relação ao seu povo.
Apesar do seu sentido de equilíbrio, só podia
alcançar a supremacia em detrimento da sua substância.
Esgotar-se: foi esse o seu ponto de honra.
Enamorado da fórmula, da ideia explosiva, do
alarido ideológico, colocou o seu génio e a sua vaidade ao serviço de todos os
acontecimentos que ocorreram ao longo dos últimos anos, sobretudo após os que
se seguiram à entrada em vigor do euro, como moeda única da União Europeia, o
que tem conduzido o nosso país a uma tremenda depressão bem próxima da bancarrota.
E depois de ter sido vedeta, eis que o país e
sobretudo seu povo cai na miséria, uma parte da qual caiu mesmo abaixo do
limiar da pobreza, devendo o actual governo recorrer a uma nova forma de “sopa
dos pobres” nas escolas e através de associações de benemerência.
Eis o país resignado, receoso, ruminando os
seus remorsos e apreensões, descansando do seu fulgor, do seu passado.
Foge do seu rosto, treme diante do espelho…
As rugas de uma nação são tão visíveis como as de um indivíduo.
Quando se fez uma grande revolução, não se
volta a desencadear outra de igual importância. Se por muito tempo se foi
árbitro do gosto, uma vez perdido esse lugar, não se pode tentar
reconquistá-lo.
Quando se deseja o anonimato, é porque se
está cansado de servir de modelo, de ser seguido, macaqueado: para quê
continuar a ter um salão para divertir o universo?
Estas verdades de La Palisse, conhece-as
Portugal bem de mais para as repetir a si próprio. Nação de gesto, nação teatral,
amava a sua arte e também o seu público. Está farto, quer abandonar o palco e
já apenas aspira aos cenários do esquecimento.
Não se pode pôr em dúvida o facto de Portugal
ter gasto a sua inspiração e os seus dons, mas seria injusto censurar-lho;
seria o mesmo que acusá-lo por se ter realizado e cumprido outrora.
As virtudes que faziam dele uma nação
privilegiada, corroeu-as à forças de tanto as cultivar, de tanto as valorizar,
e não é por falta de exercício que os seus talentos hoje empalidecem e se
apagam.
Desde que Portugal abandonou os seus
desígnios de dominação e de conquista, o acabrunhamento, o tédio generalizado,
devora-o. Flagelo das nações em plena defensiva, devasta a sua vitalidade; em
vez de se prevenirem contra ele, suportam-no e habituam-se-lhe a ponto de já
não o poderem dispensar.
Entre a vida e a morte, encontrarão sempre
espaço bastante para escamotear uma e outra, para evitar viver, para evitar
morrer.
Vítimas de uma catalepsia lúcida, sonhando
com um status quo eterno, como reagiram
os portugueses contra a obscuridade que os assedia, contra o avanço de
civilizações opacas?
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