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quinta-feira, 30 de maio de 2013

«ENTRE A PARVOÍCE E A IMBECILIDADE POLÍTICAS»

Conhecemos o arco principal do edifício foucaultiano que apresenta, por um lado, o anúncio da morte do homem e, pelo outro, a condenação do humanismo clássico.

Quantos gritos e mal-entendidos, quantos processos de intenção e erros de interpretação, sobre estas duas questões !

Alguns, na maioria anglo-saxónicos e, entre a parvoíce e a imbecilidade, a malevolência ou a asneira sem fundo, colocaram em perspectiva estas duas teses e as misérias do século XX, Auschwitz e Kolyma, Pol Pot e Yunnan.

Fim do sujeito ? Morte do homem ? Condenação do humanismo pelo pensamento ? Ossários, campos de concentração e de extermínio, regimes totalitários e legitimação dos integrismos na história, nada foi portanto poupado ao filósofo em matéria de leituras sumárias limitadas às revistas onde, desde há um certo número de anos, acampam as reflexões ditas autorizadas.

Outras críticas, maais finas, dotadas de melhor argumentação, mas tão desejosas quanto as anteriores de arredar tais pensamentos, a fim de instalar os seus sofás na direcção da história em voga, fustigaram Foucault acerca desses dois pontos, tratando de demonstrar como, com semelhantes opções teóricas, não se podia fundar uma filosofia política, uma teoria do direito, ou até uma simples e pura reivindicação metafísica ou ontológica.

Desaparecido o sujeito clássico, não se pode, evidentemente, nem fundar, nem legitimar, uma ideologia apoiada nas religiões dos direitos do homem e no individualismo liberal.

Em compensação, tendo ficado o lugar bem nítido, pode encarar-se uma nova figura, um novo direito, uma nova filosofia política e até uma nova intersubjectividade.

Ao libertarem-se das antigas categorias, os modernos proibiram-se, infalivelmente, de quaisquer possibilidades de construir uma antiga ordem.

Mas, que interesse teriam em destruir aqui, para reconstruir a mesma coisa acolá ?

Nem Foucault, nem Deleuze, como nietzscheanos esclarecidos, se sacrificam à ética obrigatória da fundação e da legitimação, que dizem mais respeito aos tópicos kantianos.

Na opinião deles, a genealogia, que leva em linha de conta as forças, deve suplantar qualquer construção arquitectónica da razão pura ou prática.

Nem cúmplices, nem verdugos responsáveis pelo sangue derramado neste século, nem kantianos abortados, pela simples razão que deixaram Kant bem para trás, numa vontade deliberada e conjunta de derrubar o platonismo, Deleuze e Foucault formulam simplesmente uma teoria que vale como ruptura epistemológica.

Ela secciona em dois este vigésimo primeiro século, para deixar de um lado os defensores de Apolo debatendo-se com o seu velho mundo e, do outro, os que se sacrificam a Dionísio e se esmeram a cartografar outra realidade, onde a vida e o princípio do prazer não são considerados como nada ou, somente, como quantidades negligenciáveis.


E, daí, por um lado, a parvoíce e, pelo outro, a imbecilidade existentes hoje em dia na esmagadora maioria dos que se arvoram em líderes políticos seja em que canto for do mundo.

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