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domingo, 10 de março de 2013

«O SUBLIME POLÍTICO»



Um tanto acabrunhado, resolveu frequentar idiomas que, na sua maioria, lhe davam a ilusão de um poder sem limites, o político arrebatado, apaixonado pelo improviso e pela desordem, inclinado aos excessos ou ao equívoco por incapacidade de clareza, embora aborde o francês timidamente, não deixa de ver nele um instrumento de salvação, uma ascese e uma terapêutica.

Praticando-o, cura-se (…) do seu passado, aprende a sacrificar todo esse fundo de obscuridade a que está apegado, simplifica-se, torna-se outro, talvez, desiste das suas extravagâncias, supera a sua antiga perturbação, acomoda-se cada vez mais ao bom senso e à razão; de resto, poderá perder-se a razão quando é forçoso utilizar-se um instrumento que reclama o seu exercício, ou até o abuso dela?

Como ser louco em semelhante língua? Todas as suas palavras parecem cheias da significação que traduzem: palavras lúcidas.

Servir-mo-nos desta língua para fins políticos equivale a uma aventura ou a um martírio.

«É belo como uma rosa». Ironia francesa por excelência. O universo reduzido às articulações da frase, a prosa como única realidade, o vocábulo metido para dentro de si próprio, emancipado do objecto e do mundo: sonoridade em si, cortada do exterior, trágica ipseidade de uma língua acossada pela sua própria perfeição.

Quando consideramos o estilo político actual, não podemos deixar de nos interrogar sobre as razões da sua corrupção. O político moderno é um solitário que escreve e fala para si próprio ou para um público acerca do qual não tem uma ideia precisa.

Nem se esforça por exprimir os seus traços característicos: mas trata-se de uma época forçosamente sem rosto. O político ignora a quem se dirige, não pode representar-se o seu auditor.

No século XVII e no que se lhe seguiu, o político, como o escritor, tinha em vista um círculo restrito cujas exigências, grau de finura e de acuidade conhecia.

Limitado nas suas possibilidades, não podia afastar-se das regras, reais se bem que não formuladas, do gosto.

A censura dos salões, mais severa que a dos críticos de hoje, permitiu a eclosão de génios perfeitos e menores, apreciadores da elegância, da miniatura e do trabalho bem acabado.

Hoje em dia, tudo são mentiras e ilusões, dramas e corrupções, o gosto forma-se através da pressão que os ociosos exercem sobre as letras, formando de forma requintada o bastante para impor o seu tom às sociedades, que vivem cada vez menos esclarecidas.

Soma de imperceptíveis coacções, sentido da medida e da proporção, vigilância exercida sobre as próprias faculdades, discrição, pudor relativo às palavras, o gosto é característico de políticos que, longe de sofrerem da mania de serem “profundos”, se vêm na obrigação de se sacrificarem, pelo menos uma parte da sua força em benefício de uma grande anemia intelectual.

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