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quarta-feira, 27 de março de 2013

«POR UMA MEDICINA HUMANISTA»


Para se não deixar ir ao ponto de esquecer o interesse do doente, para não ultrapassar o que lhe é permitido, é preciso que a cirurgia conserve a preocupação do humano, o cirurgião mantendo-se o servidor compreensivo e respeitoso do homem doente.

Todo o cirurgião deve ter o sentimento profundo do respeito devido a cada um dos cidadãos, à pessoa humana.

Presença do homem na cirurgia, poder-se-ia dizer!

Procurei uma palavra para designar o que pretendia exprimir assim (…) A de humanismo impôs-se-me; humanismo: atracção do homem para o ser humano, preocupação do individual, procura de cada um na sua verdade.

Bem sei que na tradição da escola, a palavra humanismo tem todo um outro significado e nem deveria compreender-se que de uma atitude desejada da inteligência.

Mas, nos nossos dias e no termo de uma longa meditação, a concepção humanista afirmou-se mais ampla que nunca. Toma por objecto o homem todo ele, o homem indivíduo, nas obras do seu espírito, nos movimentos da sua inteligência e do seu coração, nas suas inquietações, nas suas esperanças, na sua aspiração à vida.

É, pois, uma corrente de pensamento que se pode fazer passar através da cirurgia.

De facto, este humanismo, é o que todo o médico sentir despertar em si no contacto com o sofrimento e a miséria dos homens.

É o que permite ao cirurgião estar próximo do doente atormentado, próximo sem esforço, sem palavras aprendidas desde que a doença aflora e faz vir à superfície da vida secreta onde a psicanálise encontrou matéria a explorar tantas revelações. Só ele pode manter a cirurgia na linha direita, pois ele é a única moral que pode fixar, para cada cidadão, o limite dos direitos e o dos deveres.

Infelizmente, as faculdades de medicina não se preocupam. Não ensinam esta ciência do homem total (…). Sem dúvida, no hospital, diariamente, mestres de alta consciência pregam o humanismo para exemplo de todos. Mas o quadro das lições vividas e por vezes de tal modo inumanas que a ideia se dilui.

Nos hospitais, tudo o choque o humanismo: a promiscuidade dos corpos, a violação das intimidades secretas, o impudor da vizinhança, o contacto permanente com o sofrimento, a indiferença perante a morte.

Assim, pode-se abordar a cirurgia sem se ter compreendido o valor humano, sem estar moralmente preparado para o que se impõe. E é daí que vem o maior perigo.

Sem dúvida, os médicos são geralmente impregnados de uma cultura clássica que ajuda a compreender o homem, mas na idade em que se colocou em contacto com o pensamento antigo, o futuro médico é demasiado jovem para compreender o significado real.

E é mais tarde, e dele mesmo, que, sensível à miséria dos homens, o médico encontra na cama do doente o verdadeiro sentido da sua profissão.

É verdade, a maioria dos médicos são humanistas, mas talvez fosse bom que não se deixe para trás duas mensagens da experiência.

É o porquê de haver lugar a dizer que os deveres do pensamento humanista impõe aos médicos, cirurgiões, porque é que a cirurgia deverá ser sempre à medida do homem, nunca à da sua carteira ou conta bancária.

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