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segunda-feira, 25 de março de 2013

«RIVALIDADES INDUSTRIAIS»


Se a indústria portuguesa, para fazer face à concorrência estrangeira, deveu frequentemente, nos nossos dias, constituir-se em “trusts e cartéis” foi durante muito tempo dirigida por homens que esperavam manter-se donos dos seus negócios e que a geriam como um bem estritamente pessoal, ou, quando muito, familiar.

O senhor “Marcolino”, velho de 72 anos, e bastante rico, fazia da indústria como os velhos ingleses fazem do golfe, com devoção.

A uma pergunta de seu neto, responde: “para quê passar uma vida curta a fabricar tecidos?”, teria certamente respondido. “Para quê viver se não se fabrica?”

Mas, toda a conversa que não tratasse da técnica da sua especialidade, não era para ele que um ruído negligenciável.

Descendente de lavradores que se tinham feito tecelões noutros tempos, o senhor “Marcolino” guardava desta origem camponesa uma necessidade violenta de trabalho e uma desconfiança incrível. As suas respostas admiravam pelo desprezo selvagem dos homens. Dizia: “Todo o negócio que me propõem é mau, pois se fosse bom não mo proporiam.” Mas, dizia também: “Tudo o que não é o próprio a fazer, nunca mais se faz.” “Todas as informações são falsas.”

A brutalidade das suas respostas amedrontavam os produtores de lã, cujas mãos tremiam ao abrirem perante ele os seus embrulhos. Ele não acreditava que a amabilidade e a solvabilidade fossem virtudes compatíveis, e, a um cliente adulador, cortava-lhe o crédito.

Com os estrangeiros, que tratava de “exóticos”, sem distinguir os europeus dos restantes, recusava qualquer comércio.

Como todos os grandes místicos, o senhor “Marcolino” vivia uma vida austera. O luxo era, a seus olhos, o primeiro dos sinais de indigência. Nas mulheres, não via senão os tecidos com que se vestiam. Na sua boca, ao vê-las, apenas uns murmúrios…

Só envelhecia aos domingos, e férias tê-lo-iam morto. As suas únicas paixões eram o amor aos “negócios” e o ódio que dedicava a seus concorrentes.

Em face da indústria imperial dos cartéis alemães, esta indústria portuguesa do antes da Segunda Guerra Mundial, mantinha-se feudal e até belicosa.

Alguém que dissesse ao senhor “Marcolino” que algum dos seus concorrentes vendia mais barato que ele, fazia com que, de imediato, baixasse os preços, como aumentava o salário a todo o que lhe fornecesse informações sobre os seus rivais.

O senhor “Marcolino” considerava a indústria como um desporto guerreiro e não falava que com orgulho dos golpes recebidos durante as campanhas de época.

Para ele, todos os seus concorrentes eram loucos, e dizia-o desde  há mais de quarenta anos.

Quando fechou os olhos pela última vez, sem descendentes directos, mas com um filho de uma empregada dele, com quem manteve relações secretas, que foi o seu único herdeiro, a fábrica, em vez de se renovar, foi vendida a um dos seus rivais e
seu filho decidiu gozar os rendimentos, acabando por se tornar em mais um político.

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