Se apenas se tratasse de imagens claras,
límpidas, despidas de qualquer sugestão sentimental, o mal não seria muito
grande. Mas toda a imagem que concretiza um sentimento profundo, essencial,
nascido do instinto, que nele mergulha e está como que aureolada por ele, é,
pelo menos, duplamente mais perigosa. É desse poder de sugestão que tantos
políticos abusam.
A grande arte da vedeta é desencadear essas
tempestades sentimentais, que, em serem puras ilusões, não são, mentalmente,
menos perigosas.
O cidadão que lê um livro, que assiste a um
filme, os vive, literalmente, não se tenha dúvida.
E com que intensidade, com que insuspeitada
violência!
A vida real, a vida realizável pouco valem a
seus olhos. A imaginária, para ele, tornou-se realidade. Vive num universo fictício,
que lhe é sugerido, imposto.
E esse universo inconsciente, mas cuja
inconsistência não percebe, superpõe-se ao universo imediato, de que ele só
reconhece uma parte.
Abandonemo-lo a essa magia, não procuremos
defendê-lo dela, e o que acreditamos lhe poderá suceder, senão que a sua vida
será mais sonhada que pensada, mais sugerida que voluntária?
Depois, será bem esse o meio de o retirar
dessa crise, que é a crise do seu tempo, e de o conduzir, insensível, mas
firmemente, ao domínio de si, que é a forma mesma da maturidade?
Magia da imagem política e do sentimento
associados, aí está o segredo desse desvio mental – a expressão não é bastante
forte – que se observa nos cidadãos, talvez sobretudo nos mais jovens –
adolescentes - frequentadores das salas
obscuras.
Daí, não é de admirar com os crimes
passionais, frequentes entre certa gama da cidadania, e que não têm outra
origem.
E para que um crime desse género,
efectivamente realizado, há outros milhares que são sonhados. Não há entre
estes e aqueles distância maior que a ocasião!
Aliás, para que se fique convencido do poder
da imagem “sentimentalizada”, se me permitem essa expressão, basta observar um
jovem adolescente a ler um livro que o apaixona. Ou observá-lo depois de um
espectáculo filmado, embora bom.
Em vez de ser o criador da sua própria vida,
tornou-se o arremedo da vida – imaginária – de outrem.
A imagem impõe-se-lhe, e impõe-se apesar
dele.
O universo fictício, a miragem, que são
ajustáveis ao mundo real e concreto, causarão uma anomalia na acção, que será o
sinal da anomalia mental de que o cidadão, mais ou menos jovem, é vítima.
Pode-se julgar que isso seja progresso? E a
palavra “desvio” será muito forte?
E ainda mais: se o mundo fictício, em virtude
do poder de sugestão que possui a imagem “sentimentalizada”, corresponde aos
verdadeiros valores humanos, o dano moral que sofrerá o cidadão, em especial o
adolescente, embora certo, não será muito grande.
Infelizmente, nem sempre é assim. Diria
mesmo que hoje em Portugal, nunca é assim, muito ao contrário!
Porque eles fazem aumentar os danos mentais,
pela ruína moral. E não se pode imaginar, a não ser por confidências recebidas,
todas as tentações, todas as obsessões que podem provocar um romance ao vivo ou
um filme, também ao vivo e que, aos olhos de todos, parecem bons. Com maior
razão se as afabulações, as descrições, a intriga, a apresentação forem – como costumam
ser – imorais e obscenas.
Sem comentários:
Enviar um comentário