Oposição
acusa ex-secretário de Estado de deixar a ideologia sobrepor-se à lei e Partido
Comunista fala mesmo num "acto à margem da lei".
Viegas
no Parlamento
“Tomei a minha decisão dentro da legalidade”, disse esta
terça-feira na Assembleia da República o ex-secretário de Estado da Cultura
Francisco José Viegas, que pediu ao Governo para ser ouvido na Comissão de
Educação, Ciência e Cultura sobre o polémico “caso Crivelli”, relativo à
autorização de saída de Portugal e venda no estrangeiro da pintura protegida Virgem com o Menino e Santos,
do conhecido empresário Miguel Pais do Amaral.
Na comissão, que se tornou
rapidamente numa batalha jurídica, Viegas citou uma sequência de artigos da Lei
107/2001, conhecida como Lei de Bases do Património, que entendeu justificarem
a decisão que tomou em 2012.
Contudo, a partir da mesma lei,
apenas citando artigos diferentes, a oposição em peso apontou os motivos porque
entende que essa decisão não tem qualquer enquadramento legal – os mesmos
motivos por que está agora em revogação pelo sucessor de Viegas no também
Governo de Passo Coelho.
Entre outros, Viegas citou o ponto 1 do artigo 55º que diz que
só são considerados bens móveis integrantes do património cultural português
aqueles que “constituam obra de autor português ou sejam atribuídos a autor
português, hajam sido criados ou produzidos em território nacional, provenham
do desmembramento de bens imóveis aí situados, tenham sido encomendados ou
distribuídos por entidades nacionais ou hajam sido propriedade sua, representem
ou testemunhem vivências ou factos nacionais relevantes a que tenham sido agregados
elementos naturais da realidade cultural portuguesa, se encontrem em território
português há mais de 50 anos ou que, por motivo diferente dos referidos, apresentem especial interesse
para o estudo e compreensão da civilização e cultura portuguesas”. Viegas não
citou, contudo, o ponto 2 do mesmo artigo, onde se esclarece que se consideram
ainda bens do património nacional “aqueles que, não sendo de origem ou de
autoria portuguesa, se encontrem em território nacional e se conformem com o
disposto no n.º1 do artigo 14.º”. Este último artigo diz que são
todos aqueles “que representem testemunho material com valor de
civilização ou de cultura”. É este o caso da pintura de Pais do Amaral, segundo
vários especialistas em pintura e património a que o gabinete do próprio Viegas
pediu pareceres em 2011 e cujos pedidos de permanência da obra em Portugal
acabaram por ser ignorados.
Há aqui também uma questão ideológica
óbvia e que eu não escondo
Francisco José Viegas
Em resposta a questões de Miguel Tiago, do Partido Comunista,
Viegas acabou por afirmar o seu posicionamento ideológico:
“Há aqui também uma questão ideológica óbvia e que eu não
escondo”, disse, referindo-se ao entendimento de muitos membros do PSD e CDS
sobre a forma como a protecção do património não deve sobrepor-se ao direito à
propriedade privada. Segundo a oposição, contudo, o que esteve em causa na
decisão de Viegas foi “um acto à margem da lei”:
“A lei diz que podia ter impedido a saída. A sua perspectiva
ideológica corresponde a um posicionamento legítimo. Já governar contra o que a
lei estabelece é abusivo”, disse Miguel Tiago.
L.
A. V.
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