Andar aos tiros daquela
maneira numa televisão generalista só pode ter um resultado: a bala escapa-se
pela culatra e Judite de Sousa é agora ostensivamente odiada pela comunidade
online
As redes sociais explodiram de raiva e indignação há poucos dias,
após o inquisitório interrogatório (recuso-me a chamar “entrevista” àquilo) que
Judite de Sousa fez a um jovem milionário. E com razão. A pergunta é: com a
oferta televisiva que temos, para onde vai o jornalismo da hora de jantar?
Comecemos pelo princípio: não é a
primeira vez que Judite de Sousa surpreende a comunidade jornalística e o
público em geral com a sua (perda de) ética profissional. Por algum motivo, a
mudança para a TVI tirou-lhe o cunho de seriedade que sempre e tão bem ostentou
na RTP. Desde as reportagens de salto alto às animadas conversas com Medina
Carreira, o trajecto profissional da pivô tornou-se acidentado. Até o Marcelo
se viu obrigado a mudar o paradigma dos seus comentários, ornamentando-o agora
com esta e aquela prendinha de levar as mãos à cabeça.
Judite de Sousa agarrou, mais uma
vez, nos sentimentos que tinha mais à mão e disparou-os violentamente na
direcção de um miúdo que pouco ou nada terá feito para ser milionário.
(Recorde-se que já há alguns meses tinha tido laivos de adolescente ansiosa ao
entrevistar um bonzão brasileiro.) Se fosse uma conversa de café, Judite talvez
tivesse alguma razão nos seus juízos de valor sobre o estilo de vida do garoto
— e mesmo assim, que eu saiba, cada um faz o que quer com o dinheiro que tem.
Andar aos tiros daquela maneira
numa televisão generalista só pode ter um resultado: a bala escapa-se pela
culatra e Judite de Sousa é agora ostensivamente odiada pela comunidade online.
Será que a apresentadora do telejornal anda a ver muita Fox News? Uma curta
pesquisa pelo Facebook mostra já páginas com nomes como “Judite
de Sousa – A vergonha do Jornalismo Português” ou “Judite
de Sousa, o exemplo do mau jornalismo em Portugal”. Ouch!
A pena é que a tendência não
parece estar a melhorar. A RTP continua com a aura (verdadeira ou não) de ser
manipulada pelo Governo. A SIC exagera na originalidade e, ora mostra malta no
Sudoeste a viver em caravanas e a tomar duches de mangueira ao som do “Je
T’Aime… Moi Non Plus”, ora dá tempo de antena à campanha política apartidária
de José Gomes Ferreira. E a TVI, apesar de ter demonstrado significantes
melhorias com a chegada de José Alberto Carvalho, continua a perder-se nestas
ridicularias. Manuela Moura Guedes encontrou aqui uma sucessora à altura.
A televisão parece ter agarrado
com unhas e dentes o objetivo de passar a ser "infotainment" —
pândega disfarçada de notícia. Uma amiga pessoal postou uma mensagem na página
de Facebook da TVI com a qual concordo, propondo que a estação de Queluz de
Baixo agarrasse numa parte do seu orçamento para dar (mais) formação
profissional aos seus jornalistas. Não só concordo como acredito que a medida
deveria ser extensível a todos os outros órgãos de comunicação social.
Falta tempo de reflexão e noção
de responsabilidade a quem trabalha para o público, que deve ser respeitado e a
quem deve ser prestado o melhor serviço possível. Se assim não for, Groucho
Marx continuará a ter (cada vez mais) razão: “a televisão é extremamente
educativa. Sempre que alguém a liga, saio da sala e vou ler um livro”.
=Público/Cultura=
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