A imprecisão acerca do que é o capitalismo,
nomeadamente como sistema económico, tem conduzido ao alargamento da sua
existência. Esse exagero pode levar a falar num capitalismo medieval pela
aceitação de actividades mercantis (sobretudo internacional) e de fenómenos
financeiros como empréstimos a juros. E pode mesmo conduzir a falar num
capitalismo peninsular na época da dominação romana…
Hoje aceita-se que o conceito só é aplicável
a uma realidade contemporânea.
De facto, o capitalismo é um sistema de
organização económica (e também de organização social, política, cultural e
ideológica, constituindo uma unidade que historicamente se move com desfasamentos
relativos – por exemplo, o ideológico não surge nem se transforma em sincronia
perfeita com o económico e o político).
Caracteriza-se antes de mais nada sob o
aspecto económico por ser uma actividade dirigida pelo proprietário privado de
meios de produção que, empregando pessoal assalariado, tem em vista obter um
lucro através da venda dos produtos, o que exige um mercado universalizado e
pressupõe a acumulação de meios materializados na propriedade dos meios e
instrumentos de trabalho, o capital, os capitais.
Historicamente, a situação complica-se pela
circunstância de normalmente, surgindo o capitalismo de outro ou outros
sistemas de organização económica, nem sempre os eliminar totalmente, antes
subordinando-os e marginalizando-os.
Nestas condições, pode-se assinalar a
existência de fenómenos de tipo capitalista ou paracapitalista desde a época
medieval, muito embora o capitalismo só tenha surgido em Portugal há pouco mais
de um século. Acresce, além disso, que, como é natural, o sistema económico
capitalista como sistema dominante na sociedade portuguesa, com uma história da
ordem de cem a duzentos anos no máximo, evoluiu e sofreu transformações tanto
internas como no seu entrosamento com outros sistemas de organização
concomitantes tornados residuais em escala crescente.
Na Idade Média é possível assinalar a
existência de “ilhas” de actividade económica do tipo paracapitalistas dependentes
e no fundo ao serviço da organização dominante de raíz feudal-senhorial. Neste
período, os fenómenos protocapitalistas manifestam-se nas actividades mercantis
desenvolvidas sobretudo ao nível do comércio externo por mercadores dispondo
por vezes de fundos abundantes e pela economia agrária de uma camada mais
desafogada da população não aristocrática com explorações de certo vulto e que
utilizava uma percentagem de mão-de-obra assalariada combinada com o trabalho
familiar.
Simultaneamente surge e expande-se o sistema
bancário privado, progride o sistema segurador privado também, cresce o número
de sociedades anónimas e demolem-se os últimos vestígios institucionais do
Antigo Regime, como as “lutuosas”.
Independentemente de sobre o sistema capitalista
já se obter a maior parte do produto interno do país, o capitalismo era o modo
de organização económica dominante em Portugal: em relação a ele
subordinavam-se não só formas residuais de existência comunitária em raras
zonas rurais ou de pastorícia, como sobretudo a actividade mercantil, a produção
doméstica e a artesanal simples, embora ainda dela vivesse uma importante
percentagem da população activa portuguesa.
Mas das velhas estruturas do Antigo Regime só
subsistiam no plano económico sobrevivências transformadas, sobretudo nas
relações agrárias (foros e laudémios, porém totalmente remíveis, contratos de
parceria…).
Todavia, nada disto significa que as
transformações verificadas tenham colocado Portugal na vanguarda dos países capitalistas
industrializados da época, uma vez que e basta recordar que a industrialização
portuguesa era tão modesta que assinalava apenas 362 unidades de tipo fabril
com mais de dez operários cada uma, com um total de 15897 trabalhadores apenas,
e que tal parque industrial só dispunha de força motriz do vapor.
Nos dias de hoje e com um população de cerca
de 10,5 milhões de habitantes, com cerca de 20% de desempregados de longa
duração, será que se pode afirmar estarmos em melhores condições sobretudo
sociais e laborais, num país que pagou para acabar com a agricultura e as
pescas?
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