Os partidos políticos portugueses "exigiram à
população enormes sacrifícios", mas, chamados a negociar, "foram
incapazes de fazerem, eles próprios, o sacrifício dos seus interesses",
analisa o sociólogo António Barreto.
"Era necessário que todos os partidos, ou alguns
deles, fizessem sacrifício das suas posições partidárias e dos seus interesses,
e não o fizeram. Tendo, todavia, exigido que os portugueses ganhassem menos,
pagassem mais impostos, ficassem desempregados, tivessem problemas muito sérios
do ponto de vista social, económico e financeiros", criticou o sociólogo e
ex-deputado, em entrevista à Lusa.
A convicção de que "o interesse nacional é igual
ao do partido" terá um preço, acredita o presidente da Fundação Francisco
Manuel dos Santos, que está a ultimar a conferência "Portugal europeu. E
agora?", agendada para 13 e 14 de Setembro.
"Isto paga-se, no longo prazo, no médio prazo,
paga-se. Quase ninguém hoje respeita os políticos, os partidos políticos, a não
ser as tribos, a tribo do PS, a tribo do PSD, a tribo do CDS, a tribo do Bloco
ou do PC, [que] respeitam o seu partido, como as claques de futebol",
compara.
"Há um declínio do respeito e da confiança nos
políticos muito, muito, muito grande", resume, assumindo que gostava que a
situação se recompusesse. "Porque, para vivermos em democracia e em paz, é
necessário que volte a aparecer respeito pelos políticos, mas creio que vai
demorar muito tempo", prevê.
"Desde o início" que António Barreto não
partilha da "estratégia" do Presidente da República. "Ele tem o
estilo dele. Creio que ele tem cumprido o estilo dele. Não é aquele que eu
defenderia para ele", diz.
Em resumo, toda a classe política sai "muito
fragilizada" da crise governamental mais recente, mas a
"incapacidade" para "discutir, negociar e chegar a acordo"
já é uma característica dos partidos "há quatro, cinco anos",
recorda, confessando: "Não sei quanto tempo demorará a recompor as
coisas."
Apesar de o Governo dizer "muitas vezes que quer
uma sociedade civil" activa, "é conversa", porque, "na
verdade, nos actos, nas leis, nas decisões", prefere "uma sociedade
civil submissa, que não crie problemas, que seja reverencial, que saúde e
cumprimente os senhores políticos", ironiza o sociólogo.
Por outro lado, a sociedade civil portuguesa
"adapta-se facilmente" a qualquer cenário, por pior que seja.
"Tendencialmente, os portugueses resignam-se mais do que se
revoltam", admite.
Porém, o sociólogo recusa "exagerar" essa
tendência, porque "houve momentos, nos últimos 200 anos" de
"revoltas muito profundas e conflitos muito graves" -- no fim da
monarquia, no princípio da República, no assassinato de chefes de Estado.
"Também há revolta, não é só resignação, brandos costumes ou
suavidade", alerta.
"Esta sociedade civil necessita, obviamente, de
instituições. (...) Uma pessoa levanta-se de manhã, acorda e [diz] 'vou-me
revoltar contra qualquer coisa ou vou fazer isto'? Não. O importante são as
instituições, as associações, as organizações. É nesse domínio que Portugal
sempre foi frágil", avalia.
A força e a fraqueza da sociedade civil, "sempre
dependente do Estado", seria um dos temas que acrescentaria à série
documental "Portugal -- um retrato social", que dedicou à sociedade
portuguesa. Os outros dois episódios seriam sobre as relações entre Portugal e
a Europa e a debilidade económica do país.
Lusa/SOL
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