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domingo, 7 de julho de 2013

«A INDIGÊNCIA»


Fenómeno social de múltiplas origens, a indigência permite traçar, pelos contornos que delimita e pelas relações que estabelece, a progressão do desenvolvimento económico do país e suas descontinuidades e, ainda, em termos de mentalidade, necessariamente ambivalente, porque reflexo do posicionamento diferenciado da sociedade e dos grupos resistentes à socialização, os movimentos oscilatórios e os conteúdos éticos que presidiram ao complexo histórico-geográfico português.

Associada a fomes, pestes, calamidades naturais, guerras, miséria, doença, desemprego, parasitarismo, o quadro em que se move a indigência é o de uma sociedade dilacerada pelas suas contradições, numa assumpção imperfeita e imobilista do seu devir histórico e das virtuais potencialidades oferecidas.

Note-se, porém, que se as condições se agravam no sentido do alastramento da indigência – não apenas da mendicidade – a partir do início do século XXI, de que são exemplo as múltiplas medidas legislativas repressivas, sinónimo, em última instância, não só da sua continuidade como da sua ineficácia no controlo de uma realidade de implicações profundas, tal não supõe a sua inocuidade em períodos anteriores.

Desde a crise de meados dos anos 80, cuja amplitude desenhou os contornos de uma vaga de fundo de conflitos sociais, se sucederiam as referências indicadoras do aumento da mendicidade, da indigência, reportáveis, pelo seu carácter sistematizante à péssima distribuição das verbas vindas de Bruxelas, à destruição da nossa Agricultura e Pescas também.

Esta iniciativa de D. Cavaco de Boliqueime, estipulava, entre outros articulados, ser preferível transformar as searas em campos de golfe e importar quase tudo quanto se comia, abandonando as terras do interior, mas também as alentejanas, dando seguimento a um projecto antigo, a construção da barragem de Alqueva,  que Salazar havia guardado bem fundo numa das suas gavetas.

Portanto, é a partir desse tempo que começa  surgir uma sucessão de leis sobre o regime do trabalho dos assalariados e de almotaçaria sobre os salários, que se destacam a vinda de cada vez mais subsídios a distribuir pelos amigos, a investida desencadeada pelos senhores contra tabelas reputadas de excessivas, em face da chegada da nova moeda para breve, o que iria causar uma procura de emprego no litoral ou até no estrangeiro, o que causaria supostamente melhores condições de vida, mas que traria um infindável cortejo de pobres, enfermos, famintos, aleijados, viúvas e órfãos, sob o olhar indiferente dos governantes, que afirmavam tratar-se de consequências do progresso acelerado.

Acresce que os difíceis tempos que caracterizaram o início do novo século e a sua tendência económica regressiva, inerentes aos próprios rumos que Portugal sofreu, claramente se agudizaram com a União Europeia, suposta solução para os problemas nacionais, tendo-se verificado,  fruto das exorbitantes exceções governativas sobre a população portuguesa, um largamente da mendicidade extensível a mais amplos estratos sociais e de sonâncias mais dramáticas.

Mas, apesar de avisados e de se ter solicitado um plebiscito quer ´entrada na União Europeia quer na moeda única – que se sabia irem causar “grandes assimetrias entre os portugueses” – uma vez que nunca se quis proporcionar um nível de vida comparável aos restantes países europeus (em Portugal as pensões e salários eram menos que metade do que se recebia lá fora, bastando ir a Espanha ver), o povo cedo sentiu o peso das desigualdades ms, sobretudo, o peso das medidas de austeridade, sendo apesar de tudo acusado de pretender viver acima das suas possibilidades, mas também no desemprego e na miséria que tudo isso acarretou.

Hoje vive-se o reflexo de tais políticas e da “euforia” originada por um europeísmo sem regras, com Tratados assinados às cegas, pois convinha que fossemos tomados pelos bons alunos.


Hoje, afinal, somos um país e um povo quase apátrida, vencido pela arrogância de políticos incompetentes e sem o mínimo de respeito pela cidadania nacional.

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