Nem
cúmplices, nem verdugos responsáveis pelo « sangue » derramado, nem
kantianos abortados, pela simples razão que deixaram Kant bem para trás, numa
vontade deliberada e conjunta de derrubar o platonismo, Pedro formula apenas
uma teoria que vale como ruptura epistemológica provocada por Paulo.
Ela secciona
em dois este ainda início de século, para deixar de um lado os defensores de um
Apolo debatendo-se com o seu velho mundo e, do outro, os que se sacrificam e se
esmeram a cartografar outra realidade, onde a vida e o princípio do prazer não
são considerados como nada ou, somente, como quantidades negligenciáveis.
Contudo,
para aqueles que teriam sabido lê-lo, Pedro teve o cuidado de comentar,
profusamente, as linhas anunciadoras da morte do homem, num conjunto de
intervenções em que as coisas são precisadas sem quaisquer ambiguidades.
Nem os
direitos do homem, nem o humanismo se salvam, pela simples razão que funcionam
no registo da legitimação do estado das coisas.
Cortina de
fumo prática, tela colocada entre a miséria das pessoas e os locais onde se
fomenta a sua alienação, estes dois edifícios supremos do empreendimento
burguês servem para desactivar qualquer desejo de acesso ao poder por parte
daqueles que, explorados, alienados, dele são privados e que sofrem os seus
efeitos perversos.
O humanismo
dos direitos do homem age seguindo o princípio de uma máquina destinada a
captar energias revolucionárias para as transformar em compaixão, simpatia,
condolência e outros sentimentos que não permitem atentar contra a ordem do
mundo, ao qual devemos, contudo, parte de todas as misérias humanas.
A pobreza, a
miséria, a fome, a criação de uma
vagabundagem maciça, a precaridade auxiliar do enfeudamento dos sujeitos
à produção e ao mercado livre, durarão enquanto à violência desse estado de
coisas, de que conhecemos as causas, não se oporá nada mais que uma simpatia
hipócrita, uma comiseração augustiniana, uma compaixão espinosista ou uma
condolência kantiana.
O humanismo
implica enviar a política para férias, o desaparecimento da história em
benefício de uma leitura do real segundo as antigas categorias da necessidade,
do destino, da fatalidade, da tragédia inevitável ou da dureza irrevogável.
Não estamos,
então, nada longe do pecado original que é preciso expiar. Deste modo,
atribui-se ao impiedoso uma categoria suprema da filosofia da história.
Portugal e
os portugueses vivem um momento, talvez único dessa história, onde poderão
conseguir a libertação desses enfeudamentos que os têm perseguido desde há
séculos, de conseguir enfim serem eles próprios.
Como
consegui-lo ? Não se deixando ir em « cantigas », por boas vozes
que tenham os bardos !
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