Atualmente
poucas pessoas sabem que quando foram criadas as primeiras agências de
notícias, no século 19, a Havas francesa e a britânica Reuters dividiram o
mundo entre elas. A divisão seguiu as fronteiras dos dois impérios
coloniais. A América Latina foi parar nas mãos da Havas, enquanto a
Reuters ficou com os Estados Unidos.
A primeira agência norte-americana que rompeu o monopólio foi a
United Press International (UPI), alegando que os Estados Unidos não podiam ser
vistos através dos olhos britânicos, um argumento muito parecido à queixa do
Terceiro Mundo contra o monopólio de informação do Norte.
No mundo da mídia, esta agência era considerada um gigante, por
isso foi uma surpresa quando, em 1986, um milionário mexicano, Mario Vázquez
Raña, comprou a UPI por US$41 milhões e pronunciou a célebre frase: “Eu tinha
dois jatos Falcon. Vendi um e comprei a UPI”.
Desde então a concentração de meios de comunicação em mãos de
multimilionários proliferou. Os casos de Murdoch e Berlusconi são os mais
famosos. Alguns observadores veem nisto um giro à direita, impulsionado pelos
que têm dinheiro. Não se trata de uma teoria da conspiração. Simplesmente, cem
possuidores de uma Ferrari tendem a ter uma visão mais coincidente sobre as
coisas do que, por exemplo, os donos de cem Volkswagen.
Os Estados Unidos são um bom observatório no mundo da
informação. Na verdade, o termo meios de comunicação de massa foi cunhado nos
Estados Unidos, porque as vendas dos veículos deveriam ser grandes para serem
considerados viáveis. Na Europa, a mídia não se dirigia à massas. O famoso Times de Londres (agora em mãos de Murdoch)
vendia cerca de 50 mil exemplares, e seus leitores eram a elite do Império
Britânico. Os jornais europeus eram culturais, com artigos longos e bastante
analíticos. Os meios de comunicação norte-americanos partiram na direção oposta
e assim nasceram os mass midia.
Nas últimas semanas, uma impressionante série de prestigiosos
jornais norte-americanos foi comprada por milionários. O caso mais conhecido é
o do Washington Post,
considerado o jornal mais influente junto com o New York Times.
Durante os últimos 80 anos, o Post esteve nas mãos da mesma
família, os Graham. Jeffrey Bezos, fundador da Amazon, o comprou por US$250
milhões, cifra que representa 1% dos 25 bilhões de sua fortuna pessoal (a
Amazon conta com uma capitalização de mercado de US$128,37 bilhões). A venda
incluiu no pacote vários outros jornais locais, avaliados há dez anos em US$5
bilhões.
Este fato é um golpe de morte definitivo para os jornais de
propriedade familiar. Houve um tempo em que os Chandler eram proprietários do Los Angeles Times, os Copley doSan
Diego Tribune, os Cowles do Minneapolis
Star Tribune, e os Bancroft do Wall
Street Journal (WSJ).
Aquelas famílias defenderam a independência e a identidade de
seus jornais. É patente a diferença entre o WSJ dos tempos dos Bancroft e o de
agora, propriedade do onipresente Murdoch.
Até quando o NYT continuará sendo a última referência
do jornal familiar, neste caso propriedade de quatro gerações da família
Sulzberger, desde 1896? O NYT não sofre perdas, mas não deixa de ser
um peixinho em um mundo de tubarões. Tem uma capitalização de mercado de
US$1,67 bilhão contra os US$56,663 bilhões de ativos da Murdoch News
Corporation, os US$27 bilhões da família Bloomberg, os US$93,86 bilhões do
Facebook, ou os 284,04 bilhões do Google. Dito de outra forma, hoje em dia a
palavra está com o dinheiro. E, segundo parece, a batalha pelo futuro será
travada na internet.
A Aliança de Meios de Comunicação Auditados informou
recentemente sobre uma queda drástica nas vendas de revistas. A Newsweek foi comprada em 2010 por um dólar pela
IBT Media, uma companhia pouco conhecida, enquanto outras revistas, comoVogue,
Vanity Fair, Metropolitan e People seguem pelo mesmo caminho. Segundo a
mesma fonte, nos Estados Unidos as assinaturas online aumentaram de 5,4 milhões
para 10,2 milhões no último ano.
O New York
Times já superou os 60 mil
assinantes graças a uma agressiva campanha de assinaturas online. Estão seguros
de que isto garantirá a viabilidade do jornal no longo prazo e dessa forma
descartam a possibilidade de venda.
No entanto, o que se avizinha no horizonte é que a linha que
separava os meios de comunicação, quanto ao conteúdo, das redes de
distribuição, está ficando apagada. Google, Facebook, Microsoft e Yahoo buscam
mais notícias para transmitir, e mais publicidade. Com a compra do YouTube e do
Zagat, o Google entrou com tudo no campo do conteúdo.
O Yahoo comprou um novo sistema de microblogging, que permite
que 119 milhões de usuários publiquem rapidamente palavras e imagens, por
US$1,1 bilhão, mais que o triplo dos preços combinados das vendas do Post e do
Globe. Nada mais demonstrativo de como os nomes de prestígio estão a preço de
banana.
Entretanto, os assinantes online representam uma mudança
antropológica em relação ao antigo leitor. As suas são mentes inquietas, ansiosas
por mudar de página, e isto fará com que reduzam progressivamente os artigos
extensos e as análises. Este processo se acentuará na medida em que avançar a
mudança geracional.
Um detalhado estudo da Universidade de Paris indica que entre as
pessoas na faixa dos 14 aos 16 anos observa-se um período de atenção menor do
que o de seus pais, algo que qualquer professor pode confirmar.
Além disso, para os jovens está desaparecendo a fronteira entre
o jornalismo tradicional e profissional e o chamado jornalismo-cidadão,
realizado por qualquer pessoa que queira publicar notícias e fotos na rede.
Como resultado, qualquer texto com mais de 850 palavras (como este artigo muito
resumido, com mil palavras) é considerado excessivamente longo para ser
publicado. Isto faz prever um mundo melhor informado e mais consciente?
Roberto Savio é
fundador e presidente emérito da agência de notícias IPS (Inter Press Service)
e editor do Other News.
T. M.
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