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domingo, 23 de junho de 2013

«O FIM DA ESTRADA»

Sempre pensei que, cheio de amor pelo seu país, como sempre afirma estar, se aplicaria à arte do desprendimento, do desprezo, do silêncio. Qual não foi a minha surpresa quando me apercebi, ouvindo-o dizer que estava  preparar-se para se candidatar.

No mesmo instante, vi desenhar-se na sua pessoa um futuro monstro, caso vencesse as eleições, como veio a acontecer. Pensei então: “mais um que se vai perder, mais um que se vai deixar levar pela ganância, pela arrogância, pelas curvas e contracurvas da estrada que conduz ao poder”.

Aliás, tive ocasião para lho dizer mas, por pudor, abstive-me de o fazer e perguntou-me então quais as razões da minha decepção. Certamente que preferi não lhe responder de viva voz, enquanto pensava para comigo: “mais um que se vai perder, mais um que se vai arruinar devido ao seu talento”, e sorte teremos todos nós se não nos der cabo da vida.

Estou convencido de que se tivesse tido bons conselheiros naquela altura, nenhum de nós estaria a sofrer, muito menos a sociedade portuguesa com a sua deriva pela política.

Terá de convir que está por todos considerado alguém que nada percebe do que anda a fazer em Portugal e na Europa. Enveredou pelo caminho errado e, o que é pior, fez com que nele tivessemos de entrar. Fê-lo de forma como se entrássemos no inferno e fossemos obrigados, fomo-lo efectivamente, a provar todos os seus venenos.

Arrancado ao imediato, caricatura de si próprio restar-lhe-ão apenas experiências formais, indirectas; a sua pessoa desvanecer-se-á na palavra, pois esquece-se de cumprir as suas promessas e, quando fala ante os literatos, deles não tira proveito algum.

Só que é tarde demais quando disso se dá conta, após ter perdido o melhor dos seus anos num meio destituído de espessura e de substância, embora se tenha tornado naquilo  que chamam “um político”.

E o povo, que desvaloriza as suas misérias, as divulga, as repisa, fazendo-o sentir-se mais ínfimo que uma formiga quando sai às ruas do país e clama pela justiça que tarda em chegar? Isto é, a sua demissão e a devolução da palavra a esse mesmo povo par que possa mudar de rumo, desta vez com esperanças no futuro e certezas no presente.

Um indiscreto que desvaloriza as suas misérias e miseráveis formas de estar na política, vive no impudor – exibição de pensamentos reservados – é a regra de alguém que se oferece.

Todas as formas de talento são acompanhadas de certa sem-cerimónia. Distinto, é-o apenas o estéril,aquele que se apaga com o seu segredo, porque desdenha exibi-lo: os sentimentos expressos são uma dor para a ironia, uma bofetada no humor.

Conservar o próprio segredo, nada de mais frutuoso. O segredo trabalha-o, corrói-o, ameaça-o. Mesmo quando se dirige ao povo, a confissão – que nunca faz – é um atentado contra nós próprios, contra as energias do nosso ser.

As perturbações, as vergonhas, os medos, de que as terapêuticas pretendem libertar-nos, constituem um património de que por nenhum preço deveríamos desfazer-nos, pois temos de nos defender contra os que dizem curar-nos e, ainda que pereçamos por isso, preservar os nossos males e os nossos pecados.


Como não vai só na estrada que escolheu, pode parecer não se sentir tão só no caminho, mas torna-se mais que evidente que a sua solidão é cada vez mais profunda, restando-lhe apenas aquele caminho que leva ao abandono de certas megalomanias que o acossam sobremaneira.

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