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domingo, 9 de junho de 2013

«A MENDICIDADE (INDIGÊNCIA)»

















Fenómeno social de múltiplas origens, a mendicidade ou indigência permite traçar, pelos contornos que delimita e pelas relações que estabelece, a progressão do desenvolvimento económico do país e suas descontinuidades e, ainda, em termos de mentalidade, necessariamente ambivalente, porque reflexo do posicionamento diferenciado da sociedade e dos grupos resistentes `socialização, os movimentos oscilatórios e os conteúdos éticos que presidiram ao complexo histórico-geográfico português.

Associada a fomes, pestes, calamidades naturais, guerras, miséria, doença, desemprego, parasitismo, o quadro em que se move a mendicidade ou indigência é o de uma sociedade dilacerada, sobretudo durante o Antigo Regime, pelas suas contradições, numa assumpção imperfeita e imobilista do seu devir histórico ultramarino e das virtuais potencialidades que o mesmo oferecia.

Notemos, porém, que se as condições se agravam no sentido do alastramento da mendicidade a partir do século XV, de que são exemplo as múltiplas medidas legislativas repressivas, sinónimo, em última instância, não só da sua continuidade como de uma ineficácia no controlo de uma realidade de implicações profundas, tal não supõe a sua inocuidade em períodos anteriores.

Desde a crise de meados do século XIV, cuja amplitude desenhou os contornos de uma vaga de fundo de conflitos sociais, se sucederiam as referências indicadoras do aumento da mendicidade, reportáveis, pelo seu carácter sistematizante, Lei das Sesmarias de 1375. Esta, estipulava, entre outros articulados,  a prisão dos mendigos pelos juízes dos lugares, a compulsão o trabalho por justa soldada, sempre que a sua idade e saúde o permitissem e mesmo que mendigassem em traje de eremitão ou se intitulassem, não o provando, escudeiros ou servidores.

Como sanções, a recusa ao trabalho doméstico, agrícola ou artesanal determinaria a aplicação de açoites e, na sua reincidência a expulsão do Reino, por considerar o monarca que, na sua essência, confluíam e predominavam a ociosidade e a vagabundagem.

Mais tarde e já sob a administração pombalina, o Decreto de 4 de Novembro de 1755 imputava aos corregedores e juízes criminais responsabilidade do apuramento da profissão de todos os moradores dos respectivos bairros, por forma a destrinçar os casos de mendicidade e vagabundagem, inculpando, já que considerados como potenciais criminosos de primeira grandeza, os assinalados contraventores.

Mais tarde ainda e no tempo da ditadura, continuava a perseguir-se a mendicidade, chegando a afirmar-se que só não trabalhava quem não queria fazê-lo, mesmo apesar da idade ou de doença impeditiva de o fazerem, chegando a ser internados nos albergues distritais de mendicidade, considerados indigentes e podendo mesmo ser detidos e enviados para colónias penais.

Actualmente, a mendicidade e a indigência, devido às políticas vigentes, é ou são o prato do dia, pois quase desapareceram os empregos que, no entanto, quando os há, são para amigos e filhos de amigos dos políticos dominantes no actual regime.

Mudam os tempos, mudam as vontades, mas abençoa-se o neoliberalismo, a globalização económica e o povo vive, ou sobrevive graças a esmolas que vi recebendo de certas almas generosas que sofrem com o seu sofrimento.


Há poucos anos ainda, havia mesmo cartões de indigentes, com  palavra em destaque, não demorando muito tempo a que regressem, graças às desastrosas políticas sociais actualmente praticadas.

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