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segunda-feira, 24 de junho de 2013

Parcerias Pouco Privadas


Comecemos pela conclusão: foi o Estado que perdeu. Os contribuintes pagaram o que não deviam, por obras e serviços mal negociados. Houve pressões - da banca e políticas - cláusulas estranhas e muitas renegociações ainda mais prejudiciais que os acordos
A tinta do relatório preliminar ainda está fresca. Mas mal deu entrada no Parlamento, todos perceberam que a aprovação do trabalho do deputado Sérgio Azevedo, do PSD, está longe de ser unânime na comissão parlamentar que investiga as parcerias público-privado (PPP), rodoviárias e ferroviárias. Pelo contrário... 

A Comissão Parlamentar de Inquérito à Contratualização, Renegociação e Gestão de todas as Parcerias Público-Privadas do Setor Rodoviário e Ferroviário - é este o seu título - foi criada, há mais de um ano, em 24 de abril de 2012, e já nasceu envolta em polémica. A maioria (PSD-CDS) não aceitou investigar, igualmente, outras PPP, na área da saúde ou da segurança, por exemplo. A lista de testemunhas também não foi pacífica.  E o resultado, já se esperava. As conclusões podem vir a ser aprovadas apenas com o voto dos partidos que integram o Governo. À esquerda, o PS, que é o principal visado no relatório preliminar, já manifestou a sua discordância do texto, que revela, na opinião do deputado Rui Paulo Figueiredo, "uma banalidade confrangedora".  "Não estamos disponíveis para colaborar em encenações políticas que só se destinam a branquear este Governo e a criar cortinas de fumo", prosseguiu o socialista. Mas também o PCP, através de Bruno Dias, acusa o relatório de ser apenas "a visão do PSD" sobre as PPP. E Pedro Filipe Soares, do BE, critica a "falta de abrangência" do documento conhecido na terça-feira, 18. 

A parte polémica do relatório é a culpabilização, quase exclusiva, dos últimos governos socialistas, liderados por José Sócrates, pelo crescimento da fatura das PPP nas contas do Estado. E também, a sugestão, nas conclusões, de "que os responsáveis políticos à época devem ser chamados a assumir as suas responsabilidades, assim como a administração da EP, através da ação das entidades competentes". Como o caso está, em paralelo, a ser alvo de uma investigação judicial, no DCIAP, a leitura deste ponto 146 das conclusões do relatório preliminar aponta para uma espécie de "testemunho acusatório" contra Mário Lino, Paulo Campos, António Mendonça, Teixeira dos Santos e Costa Pina, os ex-governantes nomeados pelo relator (além do responsável pela Estradas de Portugal, Almerindo Marques). Aliás, a Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária solicitou à comissão parlamentar o envio das gravações das audições no Parlamento. Mas nem a Justiça, nem o Parlamento, sabem ainda como terminará esta história, que teve início em 1995, com a celebração da primeira PPP: a da Ponte Vasco da Gama, que é apontada, ainda hoje, no relatório de Sérgio Azevedo, como "um dos piores exemplos". Desde então, houve um pouco de tudo. 
Como enganar o Estado

 A União Europeia passou a "patrocinar" esta forma de endividamento "encoberto", como referiu no inquérito o professor do Técnico, Carlos Oliveira Cruz: "A Comissão Europeia e o Eurostat cometeram um erro gigantesco, que foi o de não considerar isto dívida pública, o de não consolidar isto naquilo que era a despesa do Estado." Com a porta escancarada, os governos olharam para as PPP como uma forma de "desorçamentação", salienta o relatório. Avelino de Jesus, professor do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), vê aqui o primeiro "pecado": "Este tipo de contratações não deixa de ter como base a necessidade que os poderes políticos têm de fazer obra sem se endividarem."O segundo erro foi a incapacidade do Estado para lidar com contratos complexos e parceiros privados dotados de equipas de especialistas. Carlos Moreno, juiz jubilado do Tribunal de Contas, garantiu no Parlamento que isso é comum a todos os contratos de PPP: "Notámos um défice de capacidade de gestão, de monitorização e de fiscalização dos contratos de PPP e ausência de controlo integrado por parte do setor público." E foi essa a razão pela qual muitos dos "erros" surgiram.

O Metro Sul do Tejo é um caso exemplar. O contrato de concessão foi assinado em 30 de julho de 2002. O início da exploração, em 27 de novembro de 2008. Nesses seis anos, ocuparam a tutela oito ministros, três secretários de Estado e três encarregados de Missão. Havia ainda dois autarcas envolvidos, de partidos diferentes. O Estado contribuiu com 284 milhões de euros, "ou seja, cerca de 84% do investimento total da concessão". O consórcio privado (Barraqueiro, Siemens e Teixeira Duarte) facultou 16% do investimento. Mas "sem capitais próprios", ou seja, exclusivamente com financiamento bancário. Como nota Braamcamp Sobral, à época, responsável da Refer, "para este tipo de projetos ser bancável, os bancos fizeram due diligence aos próprios estudos". Ou seja, todos os problemas que vieram, mais tarde, a onerar o Estado e a financiar as operadoras, podiam não ser do conhecimento dos responsáveis políticos, mas seriam, seguramente, conhecidos pelos financiadores. Resultado: O custo médio pago pelo Estado por passageiro é de  €0,28, no Metro Sul do Tejo, e de apenas €0,03, no de Lisboa. As renegociações acabaram sempre por prejudicar o Estado. Numa, em 2002, efetuada por Manuela Ferreira Leite, enquanto ministra das Finanças, os contribuintes portugueses passaram a indemnizar a concessionária pelos passageiros que viajam de "borla". E apenas em despesas de consultoria, o Estado pagou 225 mil euros. No total, só aqui, já se gastaram 384 milhões. À conta das "divergências" entre os governos e a autarca comunista de Almada, o relatório fala de um acréscimo de 77 milhões nos custos da obra.

=Visão=



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