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segunda-feira, 28 de outubro de 2013

«PRIMO LEVY»

Sábado, dia 11 de Abril de 1987, pouco depois das 10 da manhã, enqynto sua mulher tinha ido às compras e quando a porteira acabara de lhe entregar o correio, Primo Levu transpôs o corrimão do patamar da sua escadaria, lançou-se no vazio e encontrou-se cinco andares mais abaixo, esmagado no sopé do elevador.

O corpo daquele que vivera Auschwitz exalava assim o seu último suspiro.

Teriam ainda triunfado os nazis, meio século mais tarde? Ele não deixou nenhuma palavra a explicar o seu acto. Mas sabe-se que, desde há alguns anos, andava atormentado por uma profunda depressão. É assunto da vida privada, claro, mas quem poderá dizer aquilo que a história do mundo, ao encontrar a história singular, é capaz de produzir como reacções tenebrosas ou motivações sombrias?

Primo Levy já não suportava a ascensão das teses revisionistas e negacionistas. Decidira sair da reserva que outrora escolhera, para incutir uma maior presença em qualquer lado em que lhe parecesse necessário testemunhar, a fim de não deixar morrer duas vezes companheiros de campo e para dar um sentido à sua sobrevivência.

Páginas, conferências, colóquios, esclarecimentos, intervenções mediáticas e, depois, a antepenúltima obra, um artigo publicado na Stampa a 22 de Janeiro de 1986, que se intitulava “Buco nero di Auschwitz” (O Buraco negro de Auschwitz), no qual rejeita, ponto por ponto, as teses negacionistas de Hillgruber, para quem as câmaras de gás se reduzem a uma simples invenção tecnológica – e, por fim, o suicídio.

A ascensão destas teses na Europa – sob o falacioso pretexto de uma nec essária reconciliação entre os países –, o esquecimento da condenação daquelas e daqueles que fizeram a história sinistra dessa época, a ausência de memória que testemunham as novas gerações, a lassidão da maioria acerca deste tema, a confusão entre os registos virtuais e reais, as misturas de ficção com imagens de arquivos, o relegar, da parte do público em geral, de toda a História, digna desse nome, para as calendas gregas e, sobretudo, a permanência, disseminada pelo mundo, daquilo que fez o nazismo: tudo isto afecta uma quantidade de deportados que, uma vez regressados, não se contentam em gerir uma carreira paralela à dos antigos combatentes. Primo Levu era dessa estirpe.

Ao seu suicídio seria necessário juntar os de Bruno Bettlheim e de Jean Améry, também eles antigos deportados e, ainda, os de quantos anónimos que sobreviveram aos campos?


(…)

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