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terça-feira, 5 de março de 2013

«OS DEUSES DO ACTUAL OLIMPO LUSITANO»



Atacar deus, querer destroná-lo, suplantá-lo, é uma proeza de mau gosto, a façanha de um invejoso que tira uma satisfaação fátua do facto de enfrentar um inimigo único e incerto.

Sob qualquer forma que se apresente, o ateísmo supõe uma falta de boas maneiras, tal como acontece, por razões inversas, com a apologética; ou não será, ao mesmo tempo, uma indelixadeza e uma caridade hipócrita, uma impiedade, esgrimir em defesa de um deus, tentando assegurar-lhe a todo o custo a longevidade?

O amor ou o ódio que lhe dedicamos revela menos a qualidade das nossas inquietações do que a grosseria do nosso cinismo.

Os deuses do olimpo lusitano estão a ser atacados, não reagem publicamente, preferindo um ignóbil silêncio e pela sucapa fazer anunciar novas medidas de austeridade, espécie de vingança sobre o povo que ousou protestar massivamente pelas ruas do país.

Deste estado de coisas só em parte somos nós os responsáveis.

De Tertuliano a Kierkgaard, à força de insistir no absurdo da fé,criou-se, no cristianismo, toda uma subcorrente que, vindo por fim à superfície, ultrapassou a Igreja.

Qual o crente que, nos seus momentos de lucidez, não se considera um servidor do Insensato?

Era Deus quem deveria sofrer as consequências.

Até hoje, atribuímos-lhe as nossas virtudes; não ousavamos emprestar-lhe ainda os nossos vícios.

Humanizado, eis porém que ele se parece connosco: nenhum dos nossos defeitos lhe é estranho. Nunca a expansão da teologia e a vontade de antropomorfismo foram tão longe.

Esta modernização do Céu assinala o seu fim.

Como venerar um deus evoluído, ao gosto da moda, da moda capitalista?

Para sua maior desgraça, deus, esse ao qual me refiro especialmente, não recuperará tão cedo a sua “transcendência infinita”.

Por mim, sinto excessivamente os estigmas do meu tempo: não posso deixar esse deus em paz; na companhia dos snobs, divirto-me insistindo na sua “morte”, como se isso tivesse algum sentido.

Através da impertinência, julgamos liquidar as nossas solidões e o fantasma supremo que as habita. Na realidade, estas, aumentando, apenas nos aproximam daquilo que as assombra.

Quando o nada me invade e quando, de acordo com uma fórmula oriental, chego à “vacuidade do vazio”, acontece-me, aterrado por tal extremidade, voltar a cair em Deus, que mais não seja por desejo de espezinhar as minhas dúvidas, de contradizer e de, multiplicando os calafrios, obter um estimulante.

A experiêmcia do vazio é a tentação mística, a sua possibilidade de oração, o seu momento de plenitude. Nos  nossos limites surge um deus, ou alguma coisa que faz as suas vezes.

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